terça-feira, 13 de agosto de 2013

Veja a entrevista de Karl Lagerfeld.

Chanel grife criada por Coco e renovada por Karl Lagerfeld.

Sempre gostei de suas luvas. Você sempre as usa, seja inverno ou verão. E tem de vários modelos. Por que este apreço por elas?
Porque acho que elas são bacanas, divertidas. Tenho toneladas delas. Não as uso para esconder manchas na pele. Não as uso para aquecer a mão. Aliás, o couro não é quente. É um matéria que respira. Do contrário, nossos pés, que usam sapatos de couro, estariam sempre quentes também. Uso porque gosto. E quando alguém me pergunta: Por que você está usando luvas? Eu respondo: Por que você usa sapatos?
Para você, sobre o que é a moda?
Moda é mudança, sobre o que as pessoas usam e sobre o que expressa a alma do momento.
Você gosta de andar na rua?
Não ando muito porque as pessoas tiram foto o tempo todo. E se torna um pesadelo. Da loja da Melissa até aqui, que são dois quarteirões, foi um pesadelo.
Por que estilistas se tornaram estrelas pop? E você é talvez o maior, sua fama ultrapassa o universo fashion.
Não entendo isso. Sou a pessoa mais desinteressante do mundo. Não bebo, não fumo, não faço escândalos. Fico lisonjeado de saber que as pessoas se interessam por mim porque eu não teria interesse em mim se fosse outra pessoa.
Você já comentou que, por ter crescido em uma cidade portuária (Hamburgo, na Alemanha), sua mãe dizia que o porto era só o começo do mundo, para estar sempre aberto.
Sim. E segui seu conselho. Quando comecei na Chanel, por exemplo, me diziam: ‘Não toque nisso. Está morto. Que todos tinham tentando reviver a marca até então e não haviam conseguido.’
E o que mantém hoje a Chanel viva?
Não sei. Não há uma receita. É meu trabalho. E é sobre improvisar. Não há o que explicar. Escuto minha voz interior. E isso é tudo.
Moda é arte ou artesanato?
Artesanato. Ainda que seja muito importante, moda não é arte. E admiro as pessoas que têm paciência para costurar. Eu não tenho. Para mim é fácil ter ideias, mas alguém tem de executá-las. Alguns vestidos da alta costura levam até três mil horas para serem feitos. Já eu, os imagino, desenho… É fácil. Mas o trabalho que está por trás chega a me assustar quando penso nele.
Você sabe costurar?
Sim, mas não costuro mais. Ainda assim, entendo muito. Posso explicar qualquer problema técnico que um vestido tenha. É importante. Para que um designer se considere alguém sério, deve saber de costura. De outra forma, como é possível explicar o que está errado e encontrar uma solução. Sou muito bom em encontrar soluções.
É importante. Especialmente nos dias de hoje, em que a moda é comandada por grandes corporações.
Exatamente. Sou a pessoa certa para o trabalho que estou fazendo. Trabalho duro e não crio problemas. Não sou um drama queen.
Vê com olhos positivos esta nova era da moda?
É uma nova forma de se fazer e consumir o fashion. E moda é sobre mudança. E muda rápido. As pessoas têm que mudar e se adaptar. Quem para é ultrapassado. Não temos o privilégio de querer que o tempo se adapte a nossos gostos. É implacável. Somos nós que temos de nos de adaptar. Caso contrário, seremos esquecidos.
O que é elegância para você hoje?
O conceito de elegância mudou muito. A noção de elegância tem de ser reinventada. Os antigos standards não são mais válidos hoje. Ninguém quer ser elegante do jeito que era no passado. Hoje elegância é se sentir bem com o que você está vestindo. Se o que você veste tem a ver com você, seu estilo e seu espírito, está perfeito. Não é se vestir para ser aceito por um grupo. Isso é démodé. Ninguém liga mais pra isso. Todos os standards são de outra era. A elegância não desapareceu. Só tomou outro aspecto.
Países como o Brasil, um mercado em emergência, precisam adquirir mais cultura de moda?
Sim, mas as revistas de moda existem para isso. Me disseram que as mulheres adoram Chanel em São Paulo, que a cidade tem muito dinheiro. O Brasil é um país que tem muitos ricos e muitos pobres, não?
Você disse que, a exemplo de Niemeyer, quer morrer trabalhando. Como faz para manter um olhar curioso sobre o mundo?
Tenho que ter. Contanto que se continue interessado, que não se pense que o mundo deixou de ser interessante, é possível continuar. Eu vivo cada dia de uma vez. Não faço planos. Me adapto às circunstâncias. Quando se pensa demais no futuro, perde-se energia. Minha mãe dizia que se pode mentir para todos, mas não se pode mentir para si mesmo. Se você é honesto consigo mesmo, e acredita em você, a vida segue.
Você é do tipo que diz as verdades para as pessoas, que até assusta um pouco pela sinceridade, não?
Sim. Mas é assim que sou. Não tenho medo de nada. E tudo bem.
ocê tem realmente  300 ipods?
Tenho. Mas nunca coloco muita coisa em um único. E como preciso fazer muitas pesquisas para os desfiles, descobrir novas canções, preciso de muito espaço para guardar. Boa parte do meu trabalho é estar bem informado.
Você gosta de criar os desfiles?
Claro! Tenho um problema. O que não é feito por mim não me interessa. Do set list à coleção, faço tudo. Não sou do tipo de diretor artístico que contrata gente para fazer tudo. Sentar e ver tudo pronto não me interessa. Eu só me interesso pelo que estou fazendo.
Não acha que as pessoas estão gastando demais, tanto com moda quanto com tecnologia, e por vezes comprando o que não precisam?
Acho. E também acho que não se deve comprar o que não se precisa. Mas ficar sentado no dinheiro também não é bom. É preciso gastar para que as coisas se movimentem. Detesto gente sovina. Não há nada pior.
Desde criança você queria ser estilista?
Sempre quis ser diferente. Nunca quis ser ‘como todos’. Quando era criança na Alemanha, acha a escola chata. Sempre desinteressantes. A única coisa que eu poderia me tornar lá era professor de desenho. E minha mãe me disse: “Você tem que ir embora daqui. Não fiquei grávida por nove meses para isso.” E ela tinha razão.

Neste fim de semana, ocorreu mais um protesto contra o casamento gay em Paris. Qual sua opinião sobre isso?
Muito simples. A sociedade moderna é assim e temos de aceitar isso. Não podemos viver com os conceitos de outra era. Casais gays, com ou sem filhos, têm de ter os mesmos direitos civis que os outros. O estado tem de ser laico. Se quiserem se casar na igreja católica, protestante, na mesquita, na sinagoga, aí é outra história. Mas legalmente eles têm de ser protegidos. É muito egoísta da parte dos casais que se dizem normais não pensar nos direitos dos outros. Isso não é muito cristão, aliás. A propósito, não sou religioso. Meus pais me deram a escolha. E eu escolhi não ser nada. As pessoas dizem que ajuda ter uma religião. Mas é assim que sou.
Você criaria algo para a presidente Dilma?
Claro, mas preciso saber do que ela gosta. Ela me parece um pouco grande. Mas parece também uma pessoa otimista e carismática, mais que Angelass Merkel, que é mais fria e está sempre de cinza.

E Michelle Obama? Ela sempre usa criações de estilistas americanos.
Elá é uma linda mulher, mas não gosto da franjinha que ela está usando agora. Faz com que ela pareça uma adolescente. Acho ótimo que ela apoie a moda americana. É uma indústria como qualquer outra. E emprega muita gente. Só que as pessoas têm muito preconceito ainda contra a moda. A França é famosa pela moda, vinhos, champanhe, perfume, joias.E muita gente pensa que isso é superficial. Mas moda é importante. Afinal, do contrário, as pessoas sairiam peladas de manhã.
Como mudar a mentalidade em relação à moda?
O tempo mudará. Não ocorre da noite para o dia. Esta mentalidade de que moda não é importante é típica de países em desenvolvimento. Há o aspecto ‘macho’. Aliás, odeio esta ‘cultura do macho’, machista. Isso só ainda ocorre porque muitos homens têm medo de que as mulheres sejam mais inteligentes do que eles. E elas são.
fonte: Estadão
Ivanete Knaepkens

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